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Folha do Acre

24 nov 2014

Artigo arquivado em Hemeroteca

O jornal Folha do Acre começou a circular em 14 de agosto de 1910, quando se declarou “órgão das aspirações e dos ideaes do povo acreano”. Era editado em “Cidade da Empresa”, cidade que daria origem à atual Rio Branco, capital do atual Estado do Acre.

O Acre era então território federal (criado em 1904), dividido em três departamentos: Alto Acre – com sede na cidade da Empreza (hoje Rio Branco), onde o jornal impresso; Alto Purus – sede em Sena Madureira e Alto Juruá – sede em Cruzeiro do Sul. Este último departamento foi desmembrado em 1912 para formar mais um, o Alto Tarauacá.

Esta organização administrativa prevaleceu até 1920, quando os departamentos foram extintos. Até então, cada departamento era administrado por prefeitos, nomeados pelo presidente da República. Com a extinção, o Território Federal do Acre passou a ter um governador, também designado pelo presidente da República.

A falta de autonomia política e econômica (o Acre não tinha controle sobre o recolhimento dos impostos oriundos da sua produção de borracha, importante geradora de riqueza para o país até a década de 20) e o sentimento de abandono por parte do governo federal provocaram crescente insatisfação da população acreana, que tentou, algumas vezes, reivindicar e até mesmo se rebelar contra a situação do território. Essa mobilização da população ficou conhecida como Movimento Autonomista.

O primeiro movimento, chamado de Revolta dos Cem Dias, ocorreu já em 1910, quando o prefeito do departamento do Juruá, o coronel João Cordeiro, foi deposto por comerciantes da cidade de Cruzeiro do Sul, e a região passou ao governo de uma junta autonomista durante cem dias. A revolta foi controlada pelo Exército e, dois anos depois, o departamento perdeu ainda mais autonomia e poder ao ser desmembrado. Na primeira página do número inicial da Folha do Acre podem-se ler notícias sobre a luta pela autonomia do Acre:

"No intuito de prestarmos aos nossos leitores as mais amplas informações sobre o movimento autonomista que nesse departamento se levantou triumphante no dia 1 de junho ultimo, extrahimos os seguintes tópicos da longa e circumstanciada noticia que a respeito estampou o nosso illustre colega Cruzeiro do Sul sentindo não a podermos reproduzir na integra, attendendo á absoluta falta de espaço em nossa folha.

Há muito que os habitantes do Alto Juruá anciavam a sua libertação do regimem prefeitural que não se retribuía de nenhum modo as suas aspirações de liberdade.

A nomeação do exmo. Sr. Coronel João Cordeiro, para prefeito do Alto Juruá veio implantar no espírito popular a convicção de que o governo não concederia tão cedo a nossa tantas vezes solicitada autonomia.

A população continuava onerada pelo pezado gravame dos impostos; a verba que o governo concedia á Prefeitura era escassa e mal satisfazia as mais urgentes necessidades; a instrução publica estava ameaçada de desapparecer, pelas reduções dos ordenados dos professores; todos finalmente experimentavam a negra sensação de um eclipse que viesse obumbrar todas as nossas aspirações.

Com recurso supremo foi decidida a proclamação da autonomia do Território do Acre.

O governo seria forçado a nos conceder o que até então nos havia recuzado.

Anuciou-se a vinda á vinda a esta cidade do venerando e prestimoso chefe do Partido Autonomista, exmo. Sr. Coronel Francisco Freire de Carvalho, e, de fato, á 29 do mez passado a população do Cruzeiro do Sul, assistia comovida a mais solene e expotanea consagração feita a um vulto político."

Dois anos depois, no departamento do Alto Purus, o prefeito também foi deposto pela população. No entanto, nos dois departamentos, a prefeitura foi retomada pelo governo federal.

A insatisfação popular não diminuiu com a extinção dos departamentos em 1920 e a questão autonomista continuou em pauta até a criação do Estado do Acre, em 1962.

Foi este o contexto histórico em que circulou a Folha do Acre, um período de tensão (e conflitos) na história do Acre, que se estendeu por mais de cinquenta anos.

Lançado com quatro páginas, o jornal era propriedade de uma “Associação”, de origem não identificada. Seus primeiros diretor e redator foram respectivamente Teophilo Maia e Nelson Noronha. Em 1911 o jornal passou ao controle do Partido Constructor Acreano – “Órgão do Partido Constructor Acreano”, segundo passou a informar a edição número 50, de 14 de agosto de 1911. Nota na mesma edição informava que o jornal continuaria defendendo “os interesses do povo” e apoiando à administração municipal de Deocleciano de Souza.

No número 102, de 20 de dezembro de 1912, a Folha do Acre noticiou a primeira reforma do Território do Acre, ao publicar decreto, datado de 28 de outubro de 1912, criando o novo departamento de Tarauacá. Em 23 de novembro de 1920, no número 339, o jornal publicou decreto de 1 de outubro de 1920, que extinguia os departamentos unificando o território. Dois números depois, já no ano de 1921, o local de publicação informado não é mais o “Departamento do Alto Acre”, mas sim o “Território do Acre – Brasil”, enquanto a primeira página noticiava a chegada do primeiro governador do território unificado, Epaminondas Jacome.

No início as assinaturas anuais custavam 50$000 e semestrais 30$000. Era impresso em máquina “Marinoni” em oficina própria, na rua General Olimpio da Silveira, na Cidade da Empreza.

Fonte

Morais, Maria de Jesus. “Acreanidade”: invenção e reinvenção da identidade acreana. 2008. 301f. Tese (Doutorado em Geografia). Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2008.